
O Ministério Público de Alagoas (MPE) pediu o arquivamento de um processo em que a família de Luandenysson Santos Leite, de 24 anos, vítima de um acidente no Centro de União dos Palmares no dia 21 de julho de 2021, acusa o Hospital Regional da Mata (HRM) de negligência hospitalar.
O rapaz trabalhava como entregador de uma lanchonete quando acabou se envolvendo em um acidente de moto, e foi levado para o HRM ainda desacordado.
Ele faleceu dois dias depois de ser atendido e liberado pelo médico plantonista, que segundo a família do paciente, lhe receitou apenas “nimesulida”.
O HRM chegou a afastar o médico que atendeu o entregador e abriu um processo administrativo para investigar o caso internamente.

Paciente no Hospital Geral do Estado
Depoimento do enfermeiro
O BR104 teve acesso ao inquérito policial e a todos os depoimentos que contam no processo. Uma das testemunhas é o enfermeiro Israel Santos Silva, que atua na área da enfermagem há cerca de 25 anos, mas, em 2015, se formou como enfermeiro padrão, com especialização em urgência e emergência e também UTI.
Leia a transcrição do depoimento do enfermeiro que atendeu o paciente:
“No dia 22/07/2021, estava de plantão, quando por volta das 0:40 foram admitidos dois pacientes que tinham se envolvido em um acidente automobilistico. Que imediatamente os dois pacientes foram direto para a ALA VERMELHA, ambos conduzidos pelos Bombeiros;
QUE os dois foram atendidos pelo Médico Plantonista KARLOS HENRIQUE; QUE o paciente LUANDENYSSON apresentava um quadro clinico aparentando ser pior que o outro paciente, de modo que o mesmo permaneceu na Ala Vermelha e o outro foi para a Ala Verde;
QUE posteriormente, por ordem medica, o LUANDENYSSON foi transferido para a Ala Amarela, com prescrição no prontuário com receita externa e observação de duas horas; QUE na avaliação medica nenhuma fratura foi detectada.
QUE o depoente acompanhou a evolução clínica do LUANDENYSSON, o mesmo estava estável, responsivo e verbalizando, sem déficit motor, com os sinais vitais normais, ele apresentava apenas escoriações na face; […]
QUE por volta das 2:40, como o LUANDENYSSON não tinha mais queixa de dores, e os sinais vitais’ continuavam normais, tal paciente recebeu alta hospitalar por parte do médico e tal médico receitou NIMESULIDA (antiinflamatório).”
Depoimento de um dos médicos que atenderam o paciente
Também tivemos acesso ao depoimento do médico Luiz Carlos Cavalcante Filho, um dos cirurgiões que atenderam o paciente.
Leia a transcrição do depoimento:
“Que é médico cirurgião geral há cerca de 01 ano; QUE trabalha em regime de plantão no Hospital Regional da Mata desde a inauguração;
QUE geralmente os plantões são compostos por três médicos cirurgiões, isto na parte de trauma; QUE referente ao atendimento do paciente LAUDENYSSON, ocorrido no dia 22/07/2021, as 23:29, o depoente recorda de tal atendimento, neste dia quem fez o primeiro acompanhamento foi o Dr Alex (Clínico Geral), o qual pediu uma opinião médica do depoente e de outro cirurgião;
QUE o depoente juntamente com seu colega constataram que o LUANDENYSSON, apresentava um quadro clínico de TCE GRAVE naquele momento, o mesmo estava com um rebaixamento de consciência, na escala de Glasgow ele estava com um indice de 6 pontos, diante dos fatos foi procedido a intubação do paciente, na sequencia foi realizado contato com o HGE para a devida transferência do paciente;
QUE neste mesmo dia o depoente tomou conhecimento que o paciente tinha sofrido acidente de trânsito e que já havia sido atendido durante a madrugada e que nesta ocasião o médico plantonista fez a avaliação do paciente e posteriormente o paciente recebeu alta hospitalar;
QUE o depoente teve acesso ao relatório médico do Dr Karlos, responsável pelo primeiro atendimento do paciente LUANDENYSSON durante a madrugada, e em tal relatório o depoente percebeu que o paciente naquele momento apresentou uma escala de Glasgow 12, e que tal profissional constatou TCE leve;
QUE realmente nestes casos, não existe a necessidade real de realização de exame específico (tomografia por exemplo), exceto quando o paciente menor de idade ou com idade avançada; […]”
Depoimento do médico investigado
Também foi ouvido, em sede policial, o médico investigado de negligência, Karlos Ferreira Leão Lisboa, que informou:
“QUE referente ao atendimento ocorrido no dia 22/07/2021, por volta das 0h40min, o interrogado recorda que dois homens foram trazidos pelo Corpo de Bombeiros, os quais segundo os bombeiros tinham se envolvido em uma colisão entre duas motocicletas;
QUE o interrogado recorda que um dos pacientes aparentava estar com um quadro mais grave, o mesmo se chamava FHAYRES, e o outro de nome LUANDENYSSON não apresentava ferimentos visíveis; […];
QUE O LUANDENYSSON foi transferido para a Ala Verde porém como a ala estava cheia, o mesmo foi levado para a Ala Amarela para observação de duas horas;
QUE a saída do paciente da Ala Vermelha se deu porque o mesmo não necessitava de uma monitorização, apenas de observação, devido aos seus sinais vitais se encontrarem dentro da normalidade;
QUE apenas ocorreu indicação de observação de duas horas por parte do interrogado e que teve apenas a necessidade de prescrever Nimesulida, visto que devido a pancada o paciente necessitaria de um antinflamatório;
QUE o interrogado não teve mais contato com o paciente e nem qualquer Outro profissional comentou se o paciente teve alguma piora durante o tempo de observação;
QUE o interrogado tem plena consciência que adotou todos os protocolos no atendimento do LUANDENYSSON; QUE ‘não deixou de prestar qualquer tipo de procedimento necessário naquele momento;
QUE somente depois o interrogado tomou conhecimento do falecimento do LUANDENYSSON através dos meios de comunicação;
QUE diante dos fatos o interrogado procurou se inteirar o que tinha acontecido como LUANDENYSSON foi quando o interrogado ficou sabendo que o paciente retornou para o HRM horas depois, com um quadro clínico mais grave e que diante desse novo quadro o profissional que fez o novo atendimento procedeu com a intubação e transferência para o HGE, mas que o paciente veio a óbito dias depois;
QUE o interrogado informa que provavelmente o LUANDENYSSOM apresentava um quadro clássico de INTERVALO LUCIDO, o que naquele momento mascarou o quadro geral do LUANDENYSSON, o qual no momento do atendimento, como já foi dito pelo interrogado, apresentava um quadro clínico normal; QUE o interrogado teve acesso ao laudo da tomografia realizada no LUANDENYSSON no HGE, e informa que em tal laudo não ficou detectado qualquer tipo de coágulo do cérebro do LUPLNDENYSSON, o mesmo teve uma contusão parenquimatosa, o que inicialmente não apresentou nenhum sintoma de gravidade ou de alarme, porém após seis horas aproximadamente o paciente começou a apresentar degradação do quadro clínico por efeito de compressão em massa intracraniana devido a formação posterior de um edema vasogênico significativo, segundo informações colhidas nos profissionais que se encontravam no plantão”
O que diz o Ministério Público
Em seu pedido, o promotor Jomar Amorim Moraes, da 4ª Promotoria de Justiça, argumenta que “não há lastro probatório mínimo para apresentação de denúncia, restando requerer o arquivamento da peça informativa”.
Moraes também explica que o Ministério Público “não vislumbra existir diligência a ser realizada nessa fase e que possa trazer novas evidências aos autos, tampouco perspectiva de sua obtenção”.
Ele ainda lembra que, se surgirem novas provas, o processo pode ser desarquivado, e se for o caso, uma denúncia ofertada.

Moto que se envolveu no acidente – @Gustavo Lopes