
A atriz Maria Gladys, de 85 anos, conhecida por sua contribuição marcante à televisão, ao cinema e ao teatro brasileiro, enfrenta atualmente um dos momentos mais delicados de sua vida. Recentemente, ela foi localizada em situação de vulnerabilidade no interior de Minas Gerais, após um apelo público feito por sua filha, que usou as redes sociais para pedir ajuda e relatar que não conseguia contato com a mãe.
Em áudios divulgados, Maria Gladys revelou estar sozinha, sem condições financeiras para retornar ao Rio de Janeiro, e afirmou que sua aposentadoria vinha sendo usada sem seu consentimento. As declarações causaram comoção entre artistas, fãs e colegas de profissão, que passaram a se mobilizar para oferecer apoio à veterana atriz.
O episódio reacendeu um debate importante sobre o abandono de artistas que fizeram história na cultura brasileira, mas que, ao envelhecerem, enfrentam o esquecimento, a falta de oportunidades e a ausência de políticas de amparo específicas para profissionais da arte.
Apesar da atual fase difícil, Maria Gladys construiu uma das trajetórias mais ricas e intensas da dramaturgia nacional, com mais de seis décadas de atuação nas principais produções do país.
Uma trajetória que atravessa gerações
Maria Gladys Mello da Silva nasceu em 23 de novembro de 1939, no bairro do Cachambi, zona norte do Rio de Janeiro. Terceira filha de Rachel, após dois partos malsucedidos, ela enfrentou paralisia infantil aos três anos de idade e se tornou mãe aos 15. Ainda jovem, conheceu nomes como Erasmo Carlos, Tim Maia e Roberto Carlos, com quem teve um relacionamento na juventude. Iniciou sua carreira artística como bailarina no programa Clube do Rock, comandado por Carlos Imperial.
No final da década de 1950, iniciou sua carreira no teatro. Estreou nos palcos com a peça O Mambembe (1959), de Arthur Azevedo, ao lado de nomes como Fernanda Montenegro e Sérgio Britto. A partir dali, seguiu atuando intensamente em produções teatrais, tornando-se uma figura importante do movimento artístico no país.
Ao longo da carreira, participou de mais de 15 peças teatrais, incluindo títulos como Bonitinha, mas Ordinária (1962), As Relações Naturais (1969) e Rita Formiga (1986 e 2006), esta de sua autoria em parceria com Domingos Oliveira.
No cinema: a musa do cinema marginal
Maria Gladys também se destacou como uma das principais atrizes do cinema marginal brasileiro. Atuou em mais de 50 filmes, muitos deles com forte apelo político, existencial e contracultural. Um dos mais importantes foi Os Fuzis (1964), de Ruy Guerra, premiado com o Urso de Prata no Festival de Berlim.
Outros títulos de destaque incluem Todas as Mulheres do Mundo (1966), Matou a Família e Foi ao Cinema (1991), Se Eu Fosse Você (2006 e 2009), Febre do Rato (2012) — pelo qual foi indicada ao Prêmio Guarani — e Me Tira da Mira (2022).
Na TV: personagens marcantes nas novelas brasileiras
Na televisão, Maria Gladys construiu uma carreira sólida e reconhecida. Participou de mais de 45 novelas, minisséries e programas de humor, atuando nas principais emissoras do país.
Seus papéis mais lembrados incluem:
• Lucimar da Silva, em Vale Tudo (1988)
• Dinalva, em Brilhante (1981)
• Veridiana, a Big Loira de Top Model (1989)
• Dona Mimi, em Senhora do Destino (2004)
• Eveva, em Aquele Beijo (2011)
• Dra. Elizabeth Tacanha, em Pé na Cova (2016)
Maria Gladys também participou de programas como Você Decide, A Diarista, Sítio do Picapau Amarelo, Sexo e as Negas, entre muitos outros, sempre com personagens intensos, irreverentes ou sensíveis, deixando sua marca em cada produção.
Reconhecimentos e prêmios
Apesar de sua relevância, a atriz só foi reconhecida oficialmente em premiações nos últimos anos. Recebeu o Troféu Vitória pelo conjunto da obra no Festival de Cinema de Vitória em 2018, o Prêmio APTR de Teatro em 2023, além do Top of Business como melhor atriz de televisão, em 2012.
Ela é avó da atriz britânica Mia Goth, que tem feito carreira internacional no cinema, especialmente no gênero de terror psicológico.
Um nome que precisa ser lembrado
Maria Gladys é parte viva da história do teatro, do cinema e da televisão brasileira. Sua atual condição de vida escancara uma realidade cruel para muitos artistas que ajudaram a construir a cultura nacional e hoje enfrentam o esquecimento.
Mais do que uma atriz de talento, Maria Gladys representa uma geração de artistas que abriram caminhos e desafiaram padrões. Sua história merece ser contada, lembrada e respeitada — e sua dignidade, preservada.